O som surgiu primeiro levemente, quase um sussurro, um longo murmúrio que se fazia sentir ao de leve, quase inaudível. Espreitando os ouvidos de quem o procurava mesmo sem o saber. Houve quem o afastasse como quem afasta o irritante zumbido de uma mosca. Houve quem não o percebesse e passasse adiante sem mais se lembrar dele e esses foram a maioria. Houve até quem nunca o ouvisse, por ter os sentidos presos de outros movimentos, daqueles que não lhes permitem ver o belo.
Alguns pararam e tentaram escutá-lo melhor, deixaram que o som lhes fosse abarcando o ser.
Houve quem não aguentasse e fugisse. Houve quem não o compreendesse e o usasse como simples passatempo sem continuação. E houve os que o ouviram inteiros e o desenvolveram, que lhe deram vida e adoptaram.
O som transformou-se então numa canção, na canção. Naquela canção que toma muitas formas, várias tonalidades. Aquela canção que passa a ser cantada por muitas vozes, que ora se torna lenta, ora fugazmente rápida. Que solta a dança ou a introspecção, que alegra ou transporta a lágrima necessária. Que liberta ou prende definitivamente.
Aquela canção que se torna em muitas canções, em todas as canções prazenteiras que nos são permitidas.
Aquela canção que é a canção duma vida, as canções de toda uma existência. As que valem a pena, as imortais, as que acompanham do principio ao fim, as que não acabam, as que vivem para além das nuvens!
Há canções assim, basta parar um pouco e escutar o som sussurrado que nos encontra no caminho. Basta estar atento, basta querer, basta saber que há cantigas na rua à espera que as conquistem…
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