segunda-feira, 23 de maio de 2011

O Alto (VII)

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Jura quem por lá passou e que o conhecia, que nunca o viu chorar, ou lamentar-se, mas foi perdendo vivacidade, alegria e quase que morreu.
Tal como nós que o deixamos assim e que teimamos em não lá voltar.
Envelheceu. Tal como nós que nos esquecemos uns dos outros. Até que nos surge aquele dia em que acordamos as memórias e nos apercebemos que o nosso tempo se foi como um fogacho.
Porque quando o tempo é só lembrança sabemos que o presente está ao alcance da mão.
E é por isso que lá vamos voltando, mesmo que seja para ver o tempo que passou, ver as suas marcas e entender que a velhice não é uma maldição, mas apenas uma atitude. E mesmo que todos estejamos ausentes, mesmo que o Alto não passe hoje de um conjunto de árvores raquíticas, todos sabemos que aquele passado continua a ser o nosso futuro.
E quando um de nós lá põe o pé ouvimos a água do repuxo voltar a correr, mesmo que o repuxo tenha secado há muito, vemos os pardais esvoaçarem por entre as folhas dos enormes carvalhos, mesmo que agora só existam ramos secos, sorrimos ao perceber todas as gargalhadas que ainda conseguimos escutar, mesmo que agora nenhuma criança ali ponha pé.
O Alto sabe que não precisamos de lá ir para o sabermos de cor, sabe que mesmo que nenhum de nós lá volte nunca o esquecemos, sabe que agora que definha e desaparece, nunca morrerá, porque nenhum de nós morre também enquanto ele estiver connosco.
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