sexta-feira, 27 de maio de 2011
quinta-feira, 26 de maio de 2011
frases (imper)feitas (XXV)
O Alto (VIII)
(...)
E hoje, quando o olhei vi-nos a correr, logo pela manhã, a chamar uns pelos outros,
Vamos jogar ao guelas, eh Necas faz aí as covinhas, Nandito trouxeste a bola? Dois para dois ali no canto. Marito as caricas estão contigo? O Brites já está a desenhar a pista com o giz e o Maluco foi à chinchada, vem ali cheio de ameixas, daquelas verdes, uh ganda dor de barriga que aí vem.
Ao longe parece que foi há tanto tempo, mas se nos aproximarmos, se virarmos o tempo para nós, percebemos que foi mesmo agora, que nunca deixámos de lá ir e que o tempo deixou de existir, foi um fogacho que durou breves segundos, o instante que demora um fósforo a calcinar.
E hoje, quando o olhei vi-nos a correr, logo pela manhã, a chamar uns pelos outros,
Vamos jogar ao guelas, eh Necas faz aí as covinhas, Nandito trouxeste a bola? Dois para dois ali no canto. Marito as caricas estão contigo? O Brites já está a desenhar a pista com o giz e o Maluco foi à chinchada, vem ali cheio de ameixas, daquelas verdes, uh ganda dor de barriga que aí vem.
Ao longe parece que foi há tanto tempo, mas se nos aproximarmos, se virarmos o tempo para nós, percebemos que foi mesmo agora, que nunca deixámos de lá ir e que o tempo deixou de existir, foi um fogacho que durou breves segundos, o instante que demora um fósforo a calcinar.
terça-feira, 24 de maio de 2011
Histórias com Música (46)
Vagueio numa espécie de neblina. Num mundo translúcido onde ninguém me pode alcançar. Passo por muitos lugares. Lugares que conheci e outros onde nunca tinha estado.
Passo por aqui sem pesos nem dores. Como se uma leveza me trouxesse pela mão e me deixasse pairar enquanto o tempo não passa. Aqui o tempo nunca passa.
Vou-me deixando ficar. Naqueles sítios em que, apesar de toda a névoa me rodeia, o sol ainda vai aquecendo vontades.
Não sei se hei-de acreditar em tudo o que vejo e ouço. Parecem-me coisas demasiado cruéis, aquelas que se desprendem das mentes das pessoas com quem me cruzo. Sentimentos errados. Vinganças, azedumes, crispações e medo, muito medo.
Vejo um mundo carregado de rostos amedrontados, mesmo naqueles que não me vêem, que são quase todos, pelos menos até chegar a sua hora.
Sei que, quando me conseguem ver, olhar bem no fundo dos meus olhos, o medo se vai e seguem-me como se não houvesse outra escolha, como se o meu caminho fosse o último. Depois libertam-se de mim e passam a vaguear por si próprios. Também a esses uma neblina permanente se prende.
Mas eu sei que é em mim que depositam todas as expectativas. É a mim que todos acabam por chegar e, nessa altura, só nessa altura, dizem as derradeiras palavras:
Eu acredito em ti!
Passo por aqui sem pesos nem dores. Como se uma leveza me trouxesse pela mão e me deixasse pairar enquanto o tempo não passa. Aqui o tempo nunca passa.
Vou-me deixando ficar. Naqueles sítios em que, apesar de toda a névoa me rodeia, o sol ainda vai aquecendo vontades.
Não sei se hei-de acreditar em tudo o que vejo e ouço. Parecem-me coisas demasiado cruéis, aquelas que se desprendem das mentes das pessoas com quem me cruzo. Sentimentos errados. Vinganças, azedumes, crispações e medo, muito medo.
Vejo um mundo carregado de rostos amedrontados, mesmo naqueles que não me vêem, que são quase todos, pelos menos até chegar a sua hora.
Sei que, quando me conseguem ver, olhar bem no fundo dos meus olhos, o medo se vai e seguem-me como se não houvesse outra escolha, como se o meu caminho fosse o último. Depois libertam-se de mim e passam a vaguear por si próprios. Também a esses uma neblina permanente se prende.
Mas eu sei que é em mim que depositam todas as expectativas. É a mim que todos acabam por chegar e, nessa altura, só nessa altura, dizem as derradeiras palavras:
Eu acredito em ti!
segunda-feira, 23 de maio de 2011
Portugal não é um país pequeno
O Alto (VII)
(...)
Jura quem por lá passou e que o conhecia, que nunca o viu chorar, ou lamentar-se, mas foi perdendo vivacidade, alegria e quase que morreu.
Tal como nós que o deixamos assim e que teimamos em não lá voltar.
Envelheceu. Tal como nós que nos esquecemos uns dos outros. Até que nos surge aquele dia em que acordamos as memórias e nos apercebemos que o nosso tempo se foi como um fogacho.
Porque quando o tempo é só lembrança sabemos que o presente está ao alcance da mão.
E é por isso que lá vamos voltando, mesmo que seja para ver o tempo que passou, ver as suas marcas e entender que a velhice não é uma maldição, mas apenas uma atitude. E mesmo que todos estejamos ausentes, mesmo que o Alto não passe hoje de um conjunto de árvores raquíticas, todos sabemos que aquele passado continua a ser o nosso futuro.
E quando um de nós lá põe o pé ouvimos a água do repuxo voltar a correr, mesmo que o repuxo tenha secado há muito, vemos os pardais esvoaçarem por entre as folhas dos enormes carvalhos, mesmo que agora só existam ramos secos, sorrimos ao perceber todas as gargalhadas que ainda conseguimos escutar, mesmo que agora nenhuma criança ali ponha pé.
O Alto sabe que não precisamos de lá ir para o sabermos de cor, sabe que mesmo que nenhum de nós lá volte nunca o esquecemos, sabe que agora que definha e desaparece, nunca morrerá, porque nenhum de nós morre também enquanto ele estiver connosco.
(...)
Jura quem por lá passou e que o conhecia, que nunca o viu chorar, ou lamentar-se, mas foi perdendo vivacidade, alegria e quase que morreu.
Tal como nós que o deixamos assim e que teimamos em não lá voltar.
Envelheceu. Tal como nós que nos esquecemos uns dos outros. Até que nos surge aquele dia em que acordamos as memórias e nos apercebemos que o nosso tempo se foi como um fogacho.
Porque quando o tempo é só lembrança sabemos que o presente está ao alcance da mão.
E é por isso que lá vamos voltando, mesmo que seja para ver o tempo que passou, ver as suas marcas e entender que a velhice não é uma maldição, mas apenas uma atitude. E mesmo que todos estejamos ausentes, mesmo que o Alto não passe hoje de um conjunto de árvores raquíticas, todos sabemos que aquele passado continua a ser o nosso futuro.
E quando um de nós lá põe o pé ouvimos a água do repuxo voltar a correr, mesmo que o repuxo tenha secado há muito, vemos os pardais esvoaçarem por entre as folhas dos enormes carvalhos, mesmo que agora só existam ramos secos, sorrimos ao perceber todas as gargalhadas que ainda conseguimos escutar, mesmo que agora nenhuma criança ali ponha pé.
O Alto sabe que não precisamos de lá ir para o sabermos de cor, sabe que mesmo que nenhum de nós lá volte nunca o esquecemos, sabe que agora que definha e desaparece, nunca morrerá, porque nenhum de nós morre também enquanto ele estiver connosco.
(...)
domingo, 22 de maio de 2011
Histórias com Música (45)
Pegou nela pela mão, olhou-a nos olhos e encaminhou-a para o carro.
Olharam ambos o fio do horizonte onde um sol tranquilo se ia deitando.
Carregou no acelerador e arrancou. Primeiro o caminho fez-se suave, sem curvas e contracurvas, sem sombras, nem ruídos. Depois meteu a quinta velocidade e fechou o olhar.
A seu lado, ela fez o mesmo. Com os olhos semicerrados mal deixavam entrar os últimos raios de sol que os visitavam pela frente.
Acelerou, rapidamente atingiu a velocidade de cruzeiro. Quase que deixou de prestar atenção ao caminho. Os olhos fechavam-se momentaneamente, os dele e os dela. Do motor saía um rouco surdo, baixo e contínuo, mal se dava por ele.
O caminho continuava sempre em frente. As curvas que surgiam eram ultrapassadas quase sem darem por isso. Cortavam-nas sem se aperceberem.
Juravam nunca ter saído daquele carro, embora várias testemunhas tenham afirmado, convictamente, que os tinham visto sair, várias vezes. Que os tinham visto parar e caminhar. Que os tinham visto falar e até sorrir.
Mas nenhum deles se lembrava disso. Continuavam em velocidade de cruzeiro. Sempre em frente. Rumo ao sol que já se tinha posto. Em direcção a uma noite que não conhecia estrelas. Escura como breu. Como aquele alcatrão em que vogavam silenciosamente.
Quando o dia começou a despertar encontrou-os a velocidade ainda maior. Numa vertiginosa embalagem que já não admitia retorno.
Não conheciam o seu destino, nem isso lhes ocupava, minimamente, os pensamentos. Aliás estavam convictos que já não tinham pensamentos. Que avançavam apenas, sem nada esperar, sem nada importar.
Antes de chegarem à beira do abismo não repararam num sinal que avisava os mais incautos de um perigo iminente. Passaram-no a alta velocidade, roçando-lhe ao de leve.
Há quem jure que conseguiram sair do carro no último instante. Outros afirmam que não, que voaram em direcção ao precipício sem esboçarem o mínimo sinal de preocupação.
Na verdade nunca ninguém soube bem o que acontecera. O carro nunca foi encontrado. No caminho que fizeram nada ficou para testemunhar a sua passagem.
Apenas um leve vestígio ficou. Um sinal de trânsito quebrado jazia no chão a poucos metros do despenhadeiro. Apesar do mau estado em que se encontrava ainda era possível ler duas palavras, ESTRADA e FIM.
Olharam ambos o fio do horizonte onde um sol tranquilo se ia deitando.
Carregou no acelerador e arrancou. Primeiro o caminho fez-se suave, sem curvas e contracurvas, sem sombras, nem ruídos. Depois meteu a quinta velocidade e fechou o olhar.
A seu lado, ela fez o mesmo. Com os olhos semicerrados mal deixavam entrar os últimos raios de sol que os visitavam pela frente.
Acelerou, rapidamente atingiu a velocidade de cruzeiro. Quase que deixou de prestar atenção ao caminho. Os olhos fechavam-se momentaneamente, os dele e os dela. Do motor saía um rouco surdo, baixo e contínuo, mal se dava por ele.
O caminho continuava sempre em frente. As curvas que surgiam eram ultrapassadas quase sem darem por isso. Cortavam-nas sem se aperceberem.
Juravam nunca ter saído daquele carro, embora várias testemunhas tenham afirmado, convictamente, que os tinham visto sair, várias vezes. Que os tinham visto parar e caminhar. Que os tinham visto falar e até sorrir.
Mas nenhum deles se lembrava disso. Continuavam em velocidade de cruzeiro. Sempre em frente. Rumo ao sol que já se tinha posto. Em direcção a uma noite que não conhecia estrelas. Escura como breu. Como aquele alcatrão em que vogavam silenciosamente.
Quando o dia começou a despertar encontrou-os a velocidade ainda maior. Numa vertiginosa embalagem que já não admitia retorno.
Não conheciam o seu destino, nem isso lhes ocupava, minimamente, os pensamentos. Aliás estavam convictos que já não tinham pensamentos. Que avançavam apenas, sem nada esperar, sem nada importar.
Antes de chegarem à beira do abismo não repararam num sinal que avisava os mais incautos de um perigo iminente. Passaram-no a alta velocidade, roçando-lhe ao de leve.
Há quem jure que conseguiram sair do carro no último instante. Outros afirmam que não, que voaram em direcção ao precipício sem esboçarem o mínimo sinal de preocupação.
Na verdade nunca ninguém soube bem o que acontecera. O carro nunca foi encontrado. No caminho que fizeram nada ficou para testemunhar a sua passagem.
Apenas um leve vestígio ficou. Um sinal de trânsito quebrado jazia no chão a poucos metros do despenhadeiro. Apesar do mau estado em que se encontrava ainda era possível ler duas palavras, ESTRADA e FIM.
sexta-feira, 20 de maio de 2011
quinta-feira, 19 de maio de 2011
O Alto (VI)
(...)
Aos adultos não era permitida a permanência naquele reduto ímpar. Só mesmo o Ti Alfredo, o Ti Máximo e o Ti Zé, velhos guardas de jardim que nos atormentavam os dias, mas que, ao mesmo tempo nos mostravam histórias do arco da velha quando a acalmia surgia. O Ti Máximo e o Ti Alfredo saíram cedo dali, o Ti Zé ficou mais tempo, não conseguia correr atrás de nós. Era manco e a sua velha bengala de madeira não o ajudava muito. Mas eram nossos amigos e assim ficaram, mesmo depois de todas a tropelias, depois de todas as zangas, dos impropérios de uns e outros. O Ti Zé gostava de nos contar histórias da sua terra e foi ficando mesmo depois de todos nós termos partido. Um dia cansou-se e resolveu ir também, procurou a morte antes dela o ter chamado.
No Alto nem todos podiam entrar, não que tivesse portas, ou gradeamentos, nem qualquer entrave físico, apenas porque o acesso aquele mundo pequeno só era permitido a quem lhe pertencesse. E não era fácil ser por ele aceite.
Lembramo-nos de muitos que por lá passavam e de alguns que se atreviam a sentar-se nos seus bancos, mas ele sabia bem quem por lá podia ficar e não tardava a afugentar quem não merecia. Todos nós sabíamos que assim era e seguíamos-lhe os desejos, porque assim sabíamos também em quem confiar e de quem desconfiar.
Quando atingimos a idade em que os armários se abriram resolvemos sair do Alto, sem dúvidas, porque é nessa altura que todas se esbatem. Pensamos nós.
E depois disso ninguém mais lá parou e o Alto começou a definhar, pelo menos perante os olhos de quem não o conhecia.
(...)
Aos adultos não era permitida a permanência naquele reduto ímpar. Só mesmo o Ti Alfredo, o Ti Máximo e o Ti Zé, velhos guardas de jardim que nos atormentavam os dias, mas que, ao mesmo tempo nos mostravam histórias do arco da velha quando a acalmia surgia. O Ti Máximo e o Ti Alfredo saíram cedo dali, o Ti Zé ficou mais tempo, não conseguia correr atrás de nós. Era manco e a sua velha bengala de madeira não o ajudava muito. Mas eram nossos amigos e assim ficaram, mesmo depois de todas a tropelias, depois de todas as zangas, dos impropérios de uns e outros. O Ti Zé gostava de nos contar histórias da sua terra e foi ficando mesmo depois de todos nós termos partido. Um dia cansou-se e resolveu ir também, procurou a morte antes dela o ter chamado.
No Alto nem todos podiam entrar, não que tivesse portas, ou gradeamentos, nem qualquer entrave físico, apenas porque o acesso aquele mundo pequeno só era permitido a quem lhe pertencesse. E não era fácil ser por ele aceite.
Lembramo-nos de muitos que por lá passavam e de alguns que se atreviam a sentar-se nos seus bancos, mas ele sabia bem quem por lá podia ficar e não tardava a afugentar quem não merecia. Todos nós sabíamos que assim era e seguíamos-lhe os desejos, porque assim sabíamos também em quem confiar e de quem desconfiar.
Quando atingimos a idade em que os armários se abriram resolvemos sair do Alto, sem dúvidas, porque é nessa altura que todas se esbatem. Pensamos nós.
E depois disso ninguém mais lá parou e o Alto começou a definhar, pelo menos perante os olhos de quem não o conhecia.
(...)
quarta-feira, 18 de maio de 2011
Tintin americano?
Já se pode ver o trailer e eu continuo com muitas dúvidas que este seja o mesmo Tintin do qual sou um admirador fanático.
terça-feira, 17 de maio de 2011
frases (imper)feitas (XXIV)
segunda-feira, 16 de maio de 2011
O Alto (V)
(...)
Mas na verdade não interessa se eles conseguiram perceber se se tratavam de extraterrestres, se falaram com os pais ou com a professora. Retemos a cumplicidade, a partilha, a vontade de apreender, de se perderem e encontrarem todos os dias, de viverem no limite da sua infantilidade que, no fundo, conseguiram recuperar todos os dias de toda a vida, por isso lá voltavam de quando em vez, não só ao Alto, mas, sobretudo, a si próprios, sabendo, de antemão, que todos esses regressos mais não significavam que tentativas para atrasar o inevitável. Mas, no fundo, sabiam que essa inevitabilidade nunca os impediria de se tornarem os senhores do castelo sempre que o desejassem.
Como naquele dia em que o Papuço trouxe o seu gira-discos portátil, e um conjunto de singles que ninguém conhecia só para agradar à prima do Guel que tinha vindo da província passar uns dias com ele. O Papuço abriu aquela caixa mágica e pôs os discos a tocar, tornando aquele momento numa serenata que o deixava maravilhado e que a nós, todos os outros, se tornou insuportável. Claro que o Papuço foi gozado todo o santo dia, e os outros que se seguiram e que a prima do Guel nunca para ele olhou, mas ele sentiu-se feliz por ter trazido um pouco de alegria ao Alto e, no fundo, nós também.
Era assim que se vivia o quotidiano no Alto, na Ilha dos Cucos, como também lhe gostávamos de chamar. Campo de futebol, pátio de recreio, recanto de namorados, jardim infinito, em que nunca perdíamos o norte, nem quando a noite vinha.
(...)
Mas na verdade não interessa se eles conseguiram perceber se se tratavam de extraterrestres, se falaram com os pais ou com a professora. Retemos a cumplicidade, a partilha, a vontade de apreender, de se perderem e encontrarem todos os dias, de viverem no limite da sua infantilidade que, no fundo, conseguiram recuperar todos os dias de toda a vida, por isso lá voltavam de quando em vez, não só ao Alto, mas, sobretudo, a si próprios, sabendo, de antemão, que todos esses regressos mais não significavam que tentativas para atrasar o inevitável. Mas, no fundo, sabiam que essa inevitabilidade nunca os impediria de se tornarem os senhores do castelo sempre que o desejassem.
Como naquele dia em que o Papuço trouxe o seu gira-discos portátil, e um conjunto de singles que ninguém conhecia só para agradar à prima do Guel que tinha vindo da província passar uns dias com ele. O Papuço abriu aquela caixa mágica e pôs os discos a tocar, tornando aquele momento numa serenata que o deixava maravilhado e que a nós, todos os outros, se tornou insuportável. Claro que o Papuço foi gozado todo o santo dia, e os outros que se seguiram e que a prima do Guel nunca para ele olhou, mas ele sentiu-se feliz por ter trazido um pouco de alegria ao Alto e, no fundo, nós também.
Era assim que se vivia o quotidiano no Alto, na Ilha dos Cucos, como também lhe gostávamos de chamar. Campo de futebol, pátio de recreio, recanto de namorados, jardim infinito, em que nunca perdíamos o norte, nem quando a noite vinha.
(...)
domingo, 15 de maio de 2011
Os violadores do FMI
sábado, 14 de maio de 2011
O Alto (IV)
(...)
Como naquela tarde em que o Tremidinho e o Tetas correram esbaforidos perante uma novidade absolutamente assombrosa.
Todos os outros se encontravam no Alto, esperando que o dia acontecesse, que a fantasia lhes viesse bater à porta, como sempre acontecia. E eis que ela chegava agora, trazida pela eufórica corrida do Tremidas e do Tetas.
É claro que Tremidas e Tetas não eram os seus verdadeiros nomes, mas, como já vos disse, aqueles nomes secretos pelos quais eram reconhecidos perante todos nós. Nem sequer eram alcunhas, embora soassem como tal, não queriam dizer nada para fora do nosso círculo e aí identificavam cada um e davam-lhe uma singularidade notável.
Pois o Tremidas e o Tetas pararam junto de nós, que já sabíamos que o nosso momento diário tinha chegado, e com os olhos a brilhar e a adrenalina a 100 à hora, gritaram atropelando-se um ao outro, que um óvni havia aterrado no descampado por detrás da escola. Não, não o tinham visto, mas repararam nos sinais que tinha deixado, no rasto que havia ficado gravado na terra e, sobretudo, nas folhas cheias de palavras indecifráveis que estavam espalhadas por todo o terreno.
Saltámos todos como se fossemos um só corpo e corremos em direcção ao local. E era tudo verdade. Havia uma parte do terreno que estava queimada, formava um círculo não muito grande, mas o suficiente para lá caber uma nave extraterrestre, e todos nós sabíamos que os extraterrestres não eram grandes, eram assim como uma espécie de anões com umas cabeças enormes. E lá estavam os papéis, alguns deles muito chamuscados, outros, no entanto, completamente intactos. E, por muitas voltas que déssemos às folhas e às nossas cabeças, não conseguíamos perceber nada do que lá estava inscrito.
São extraterrestres gritavam o Tremidas e o Tetas, quem mais poderia ter deixado aqui estas folhas incompreensíveis, quem poderia ter feito este anel de fogo no chão?
Vieram numa nave e queimaram os papéis que deviam ter alguma fórmula secreta, quem sabe os planos para a invasão da Terra.
O entusiasmo era geral, todos estavam impacientes para mostrar aquilo a alguém que pudesse esclarecer as coisas e quem sabe senão falariam deles no telejornal, viriam a ser famosos, os rapazes que tinham descoberto os extraterrestres.
Decidiram então guardar o que restava dos papéis e, na manhã seguinte, ir mostrá-los á policia, ou aos pais, ou talvez à professora.(...)
Como naquela tarde em que o Tremidinho e o Tetas correram esbaforidos perante uma novidade absolutamente assombrosa.
Todos os outros se encontravam no Alto, esperando que o dia acontecesse, que a fantasia lhes viesse bater à porta, como sempre acontecia. E eis que ela chegava agora, trazida pela eufórica corrida do Tremidas e do Tetas.
É claro que Tremidas e Tetas não eram os seus verdadeiros nomes, mas, como já vos disse, aqueles nomes secretos pelos quais eram reconhecidos perante todos nós. Nem sequer eram alcunhas, embora soassem como tal, não queriam dizer nada para fora do nosso círculo e aí identificavam cada um e davam-lhe uma singularidade notável.
Pois o Tremidas e o Tetas pararam junto de nós, que já sabíamos que o nosso momento diário tinha chegado, e com os olhos a brilhar e a adrenalina a 100 à hora, gritaram atropelando-se um ao outro, que um óvni havia aterrado no descampado por detrás da escola. Não, não o tinham visto, mas repararam nos sinais que tinha deixado, no rasto que havia ficado gravado na terra e, sobretudo, nas folhas cheias de palavras indecifráveis que estavam espalhadas por todo o terreno.
Saltámos todos como se fossemos um só corpo e corremos em direcção ao local. E era tudo verdade. Havia uma parte do terreno que estava queimada, formava um círculo não muito grande, mas o suficiente para lá caber uma nave extraterrestre, e todos nós sabíamos que os extraterrestres não eram grandes, eram assim como uma espécie de anões com umas cabeças enormes. E lá estavam os papéis, alguns deles muito chamuscados, outros, no entanto, completamente intactos. E, por muitas voltas que déssemos às folhas e às nossas cabeças, não conseguíamos perceber nada do que lá estava inscrito.
São extraterrestres gritavam o Tremidas e o Tetas, quem mais poderia ter deixado aqui estas folhas incompreensíveis, quem poderia ter feito este anel de fogo no chão?
Vieram numa nave e queimaram os papéis que deviam ter alguma fórmula secreta, quem sabe os planos para a invasão da Terra.
O entusiasmo era geral, todos estavam impacientes para mostrar aquilo a alguém que pudesse esclarecer as coisas e quem sabe senão falariam deles no telejornal, viriam a ser famosos, os rapazes que tinham descoberto os extraterrestres.
Decidiram então guardar o que restava dos papéis e, na manhã seguinte, ir mostrá-los á policia, ou aos pais, ou talvez à professora.(...)
quinta-feira, 12 de maio de 2011
terça-feira, 10 de maio de 2011
O Alto (III)
(...)
Ainda lá vão, todos eles, mesmo que alguns já tenham partido, que quase todos tenham partido.
Porque a vida que escolheram, as estradas que percorreram e que os levaram tão longe daquele lugar, nunca lhes conseguiu retirar a magia de momentos únicos e eles sabem, mesmo os que nunca lá voltaram fisicamente, que o Alto lhes deu tudo o que desejavam e que isso era o maior tesouro que poderiam ter encontrado.
Há quem por lá passe, em dias de um completo sossego e jure que vê as árvores dançar e ouve risos de crianças quando não há nenhuma à vista.
Restos de infâncias felizes. Ou então a contínua repetição da infância, porque uma infância só será verdadeiramente feliz se a prolongarmos até à velhice e melhor ainda se a conseguirmos continuar para além deste mundo.
O Alto, como tantos outros altos neste mundo, está moribundo. Já só se vê a si próprio como um despojo daquilo que foi, parece que mirrou, se tornou pequenino, engelhado, como aqueles que ainda lá continuam a ir, mas que não o sabem, não o conhecem, não lhe ouviram as histórias, os segredos, nunca lhe viram as ruas secretas. Às vezes o Alto sorri e alguém sorri com ele, mas hoje são mais as vezes em que deita uma lágrima fugidia, porque houve mais alguém que se foi, e ele sabe, ele sente essas fugas não desejadas, mas impossíveis de impedir. O Alto é já muito velho, mais velho do que aqueles que o encheram de alegrias, de correrias e momentos únicos. Há ainda alguém que lhes conhece os meandros mais escondidos e, quando acontece um dia desses, o Alto abre as suas portas e deixa que o revejam como já foi. Nesses dias os risos soam altos, as correrias são intensas, tudo ganha uma vida nova, mesmo que mais ninguém o consiga perceber. É assim o Alto e aqueles que o sabem conhecer.
(...)
Ainda lá vão, todos eles, mesmo que alguns já tenham partido, que quase todos tenham partido.
Porque a vida que escolheram, as estradas que percorreram e que os levaram tão longe daquele lugar, nunca lhes conseguiu retirar a magia de momentos únicos e eles sabem, mesmo os que nunca lá voltaram fisicamente, que o Alto lhes deu tudo o que desejavam e que isso era o maior tesouro que poderiam ter encontrado.
Há quem por lá passe, em dias de um completo sossego e jure que vê as árvores dançar e ouve risos de crianças quando não há nenhuma à vista.
Restos de infâncias felizes. Ou então a contínua repetição da infância, porque uma infância só será verdadeiramente feliz se a prolongarmos até à velhice e melhor ainda se a conseguirmos continuar para além deste mundo.
O Alto, como tantos outros altos neste mundo, está moribundo. Já só se vê a si próprio como um despojo daquilo que foi, parece que mirrou, se tornou pequenino, engelhado, como aqueles que ainda lá continuam a ir, mas que não o sabem, não o conhecem, não lhe ouviram as histórias, os segredos, nunca lhe viram as ruas secretas. Às vezes o Alto sorri e alguém sorri com ele, mas hoje são mais as vezes em que deita uma lágrima fugidia, porque houve mais alguém que se foi, e ele sabe, ele sente essas fugas não desejadas, mas impossíveis de impedir. O Alto é já muito velho, mais velho do que aqueles que o encheram de alegrias, de correrias e momentos únicos. Há ainda alguém que lhes conhece os meandros mais escondidos e, quando acontece um dia desses, o Alto abre as suas portas e deixa que o revejam como já foi. Nesses dias os risos soam altos, as correrias são intensas, tudo ganha uma vida nova, mesmo que mais ninguém o consiga perceber. É assim o Alto e aqueles que o sabem conhecer.
(...)
segunda-feira, 9 de maio de 2011
The struggle is joy
Nunca um eurofestival português foi tão divertido e descomplexado!
The Struggle is Joy!
sexta-feira, 6 de maio de 2011
Ai Jesus
quinta-feira, 5 de maio de 2011
Arco do poder?
Hoje em dia fala-se muito dos partidos do Arco do Poder.
Tenho-me perguntado amiúde o que será isso do Arco do Poder.
Até que se fez luz e descobri:
Tenho-me perguntado amiúde o que será isso do Arco do Poder.
Até que se fez luz e descobri:
O Alto (II)
(...)
O Alto era apenas um jardim. Pequeno, com não mais de uma dúzia de bancos vermelhos e alguma relva que já vira melhores dias.
No seu centro havia um caramanchão, que lhe dava uma dignidade única e o tornava tão singular aos olhos de quem por ali passava.
Mas para eles era aí o centro do universo.
E ainda hoje quando o cabelo se tornou neve e os olhos já não permitem ver todos os vales e desfiladeiros que ali existiam há tantos anos, eles sabem de cor tudo o que o Alto esconde e sobretudo conseguem ainda ouvir todas as palavras que ali foram ditas, mais importantes que todos os segredos de estado, mais fortes que todos os poemas que embelezam os dias, porque ali se fizeram e afinal descobriram que, mesmo sem retorno, as memórias são pequenas fontes de onde jorra o elixir da eterna juventude.
O António e o Luís, o Fernando e o Eduardo, o Zé e o Jorge, o Mário e o João eram alguns dos nomes que por lá viviam, mas se lhes perguntarmos dirão que não eram esses, que eram outros os nomes, porque ali ninguém tinha o seu nome, ali todos eram conhecidos por outros nomes, que mais ninguém sabia, a quem mais ninguém poderia interessar, porque esses eram os nomes do segredo e esse segredo era o mais bem guardado do mundo.
(...)
O Alto era apenas um jardim. Pequeno, com não mais de uma dúzia de bancos vermelhos e alguma relva que já vira melhores dias.
No seu centro havia um caramanchão, que lhe dava uma dignidade única e o tornava tão singular aos olhos de quem por ali passava.
Mas para eles era aí o centro do universo.
E ainda hoje quando o cabelo se tornou neve e os olhos já não permitem ver todos os vales e desfiladeiros que ali existiam há tantos anos, eles sabem de cor tudo o que o Alto esconde e sobretudo conseguem ainda ouvir todas as palavras que ali foram ditas, mais importantes que todos os segredos de estado, mais fortes que todos os poemas que embelezam os dias, porque ali se fizeram e afinal descobriram que, mesmo sem retorno, as memórias são pequenas fontes de onde jorra o elixir da eterna juventude.
O António e o Luís, o Fernando e o Eduardo, o Zé e o Jorge, o Mário e o João eram alguns dos nomes que por lá viviam, mas se lhes perguntarmos dirão que não eram esses, que eram outros os nomes, porque ali ninguém tinha o seu nome, ali todos eram conhecidos por outros nomes, que mais ninguém sabia, a quem mais ninguém poderia interessar, porque esses eram os nomes do segredo e esse segredo era o mais bem guardado do mundo.
(...)
quarta-feira, 4 de maio de 2011
TOU XIM...
E agora, que ao que parece já há acordo para que os senhores do dinheiro entrem por aqui adentro e levem o pouco (quase nada) que nos resta, talvez possamos pensar um bocadinho mais nas asneiras que todos temos vindo a fazer nestes últimos 30 anos e consigamos chegar à conclusão que todos esses senhores que nos andaram a comandar durante todo esse tempo não são, evidentemente, capazes de nos levarem a bom porto.
Talvez esta próxima eleição seja uma excelente oportunidade para, pela primeira vez, dizermos bem alto que eles não servem. No entanto, se quisermos continuar a pastar no mesmo campo, então continuemos a deixar-nos levar pelos mesmos pastores, aqueles que se apressam a atender o telemóvel topo de gama e a responder:
TOU XIM? É P’RA MIM!
O Alto (I)
Reconheciam-se sem fronteiras. Num mundo feito de todas as fantasias que lhes eram permitidas. Num espaço pequeno que era maior que o Universo. Conheciam-se como ninguém.
Sabiam a que horas chegavam e, sobretudo, sabiam que nunca partiriam.
O Alto era o seu destino, numa vida que não queriam diferente. Ainda sem desconfiarem que iriam crescer. Ainda sem perceberem que a infância é uma felicidade fugaz, maldita, porque a deixamos ir embora sem remorso, sem dor, a não ser aquela que chega, sem avisar, no dia em que, finalmente, descobrimos que não há retorno. Nunca há retorno.
Mas, naquela altura, o horizonte é algo que está muito distante. Tão distante que nenhum tempo o conseguirá alcançar.
Era assim todas as manhãs quando iam chegando, aos poucos, ao Alto e se iam sentando nos bancos vermelhos do caramanchão. Formavam então a sua assembleia. Riam. Gritavam. Discutiam.
O mundo estava apenas no seu início.
Desbravavam caminhos que não conheciam, rumos mais perigosos que os mares nunca antes navegados.
E partiam à aventura. As ruas transformavam-se em mistérios, as casas em árvores frondosas e o tempo parava num cristal infinito que os levava para além do conhecido.
E nem o regresso forçado a uma realidade que não queriam, os obrigava a deixar o sonho.
Até que o dia seguinte chegasse e a aventura recomeçasse.
(...)
Sabiam a que horas chegavam e, sobretudo, sabiam que nunca partiriam.
O Alto era o seu destino, numa vida que não queriam diferente. Ainda sem desconfiarem que iriam crescer. Ainda sem perceberem que a infância é uma felicidade fugaz, maldita, porque a deixamos ir embora sem remorso, sem dor, a não ser aquela que chega, sem avisar, no dia em que, finalmente, descobrimos que não há retorno. Nunca há retorno.
Mas, naquela altura, o horizonte é algo que está muito distante. Tão distante que nenhum tempo o conseguirá alcançar.
Era assim todas as manhãs quando iam chegando, aos poucos, ao Alto e se iam sentando nos bancos vermelhos do caramanchão. Formavam então a sua assembleia. Riam. Gritavam. Discutiam.
O mundo estava apenas no seu início.
Desbravavam caminhos que não conheciam, rumos mais perigosos que os mares nunca antes navegados.
E partiam à aventura. As ruas transformavam-se em mistérios, as casas em árvores frondosas e o tempo parava num cristal infinito que os levava para além do conhecido.
E nem o regresso forçado a uma realidade que não queriam, os obrigava a deixar o sonho.
Até que o dia seguinte chegasse e a aventura recomeçasse.
(...)
segunda-feira, 2 de maio de 2011
Morreu um "monstro"
Hoje foi morto um monstro.
Um homem que espalhou terror, que matou inocentes e menos inocentes, mas, sobretudo, que matou. Fez aquilo que pensou ser uma espécie de justiça pelas suas próprias mãos.
Matar é sempre mau, embora haja quem julgue que, por vezes, se torna indispensável.
Confesso que a primeira vez que ouvi a notícia da morte deste homem fiquei agradado. Porque ele simbolizava o mal, o terror, a morte e o sofrimento. Depois pensei que era apenas um homem e que o mal, o terror, a morte e o sofrimento não irão desaparecer com esta morte. No fundo foi apenas mais uma, das muitas já perpetradas por ele e por aqueles que o mataram.
Não sei se o mundo ficou melhor, sei apenas que a morte continua bem viva!
Histórias com Música (44)
Nunca te conheci, nem tu a mim…
Nunca me apareceste, nunca me seguraste a mão, nem me olhaste nos olhos.
Procurei-te muitas vezes, pelos caminhos que percorri, dentro dos medos que tive, no meio dos escombros em que me encontrei.
Sei que também andaste por lá, por esses escolhos que nos trouxeram até aqui, pelas demandas em que nos perdemos, sem nunca nos vermos.
Chamei-te vezes sem conta e nunca te ouvi resposta. Penso que o mesmo aconteceu contigo.
Ainda me dói hoje, quando te sonho, em sonhos que se esfumam em fumos escuros, sem nunca me dar descanso, sem nunca te saber…
Nunca te vi, nem tu a mim…
Nunca vi a cor dos teus olhos, o calor das tuas mãos, a tua silhueta.
Embora te tenha perdido sem nunca te encontrar, sei que se me tocasses o mundo seria de outra forma. Mais perfeito naquela imperfeição que todos conhecemos. Mais doce, naquela amargura que todos esperamos. Mais colorido naquela escuridão que a todos persegue.
Sei que nos iríamos entender, sem palavras, sem gestos sequer, apenas com os olhares, evidentemente, cúmplices, mesmo daqueles que saberíamos obter quando os nossos olhos estivessem fechados.
Sei estas coisas, como decerto tu também saberás. Como sei que nos iríamos zangar vezes sem conta, por que é assim que tem que ser. Mas apenas para podermos regressar um dia a nós próprios. Mais inteiros, mais completos nas nossas insignificâncias. Mas felizes por podermos ser nós.
Apenas nós. Como devia ser.
Mas eu nunca te encontrei, nem tu a mim…
E hoje fico assim, com um buraco aberto, sangrento, imenso, na minha alma incompleta.
À espera que me digas, estou aqui, sou eu. Mesmo que nunca nos tenhamos olhado nos olhos, sabemos que somos os dois, inventados numa realidade que não queremos verdadeira, porque essa, essa é aquela que nunca existiu.
Nunca me apareceste, nunca me seguraste a mão, nem me olhaste nos olhos.
Procurei-te muitas vezes, pelos caminhos que percorri, dentro dos medos que tive, no meio dos escombros em que me encontrei.
Sei que também andaste por lá, por esses escolhos que nos trouxeram até aqui, pelas demandas em que nos perdemos, sem nunca nos vermos.
Chamei-te vezes sem conta e nunca te ouvi resposta. Penso que o mesmo aconteceu contigo.
Ainda me dói hoje, quando te sonho, em sonhos que se esfumam em fumos escuros, sem nunca me dar descanso, sem nunca te saber…
Nunca te vi, nem tu a mim…
Nunca vi a cor dos teus olhos, o calor das tuas mãos, a tua silhueta.
Embora te tenha perdido sem nunca te encontrar, sei que se me tocasses o mundo seria de outra forma. Mais perfeito naquela imperfeição que todos conhecemos. Mais doce, naquela amargura que todos esperamos. Mais colorido naquela escuridão que a todos persegue.
Sei que nos iríamos entender, sem palavras, sem gestos sequer, apenas com os olhares, evidentemente, cúmplices, mesmo daqueles que saberíamos obter quando os nossos olhos estivessem fechados.
Sei estas coisas, como decerto tu também saberás. Como sei que nos iríamos zangar vezes sem conta, por que é assim que tem que ser. Mas apenas para podermos regressar um dia a nós próprios. Mais inteiros, mais completos nas nossas insignificâncias. Mas felizes por podermos ser nós.
Apenas nós. Como devia ser.
Mas eu nunca te encontrei, nem tu a mim…
E hoje fico assim, com um buraco aberto, sangrento, imenso, na minha alma incompleta.
À espera que me digas, estou aqui, sou eu. Mesmo que nunca nos tenhamos olhado nos olhos, sabemos que somos os dois, inventados numa realidade que não queremos verdadeira, porque essa, essa é aquela que nunca existiu.
Eleições 2011
domingo, 1 de maio de 2011
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