terça-feira, 16 de março de 2010

(...) - 7

(...)A chuva continuava a ensopar os vidros. Inclemente. Mais forte.
O vento começava o seu canto monótono. Um assobio fraco que se ia multiplicando nos meus ouvidos e não me deixava pensar. Como naquelas tardes de Inverno de há muitos anos, quando olhava o céu escuro e ouvia o vento que batia no alto das árvores que sobreviviam logo à saída de nossa casa.
Costumava tentar decifrar a voz do vento. Ouvia as suas canções e percebia os seus lamentos. Guardava-os para mim, pensando que, no futuro, os iria aproveitar e iria escrever aquelas histórias que o vento me contava.
Nunca o fiz.
Talvez por tê-las esquecido, talvez por nunca as ter compreendido verdadeiramente.
Agora tinham voltado. Era a mesma voz. O mesmo lamento.
Só eu tinha crescido. Envelhecido. E o que ouvia agora estava mascarado com muitos anos de vida. Falta-me a inocência que nos faz acreditar na natureza. Mas sei que ainda posso ouvir o vento e saber as novas que ele me traz.

Sentei-me.
Sabia que ela também o tinha feito do outro lado da porta.
Quis chamá-la, mas a voz ficou-me embargada. Não saía um único som da minha garganta.
Ouvi-a mexer-se. Percebi que me tinha percebido.
Os nossos silêncios, mesmo à distância, eram mais esclarecedores que muitas conversas inúteis.
(...)

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