quinta-feira, 11 de março de 2010

(...) - 5

(...)Olhei outra vez pelo olho mágico. Ela continuava ali, expectante.
Eu sabia que ela não desertaria. Ficaria ali, esperando, até que eu abrisse a porta.
Indefesa. Como uma criança. O seu olhar era o de uma criança.
Como aquele de que me lembro agora, quando me fitava ao espelho lá de casa. Daquela casa antiga, com quintal. Onde gostava de brincar. Onde criava o mundo que queria conhecer. Longe do outro, daquele que me davam todos os dias, mas que eu não queria abraçar.
Naquele quintal eu inventava, que digo eu, criava! Dali até ao infinito. O quintal tornava-se gigante, povoado de fantasias, que de tão reais se confundiam com os meus desejos mais recônditos, ali plasmados, ao alcance da minha mão, transformados em realidades que não queria perder.
Pequenos soldadinhos de plástico em castelos feitos de tijolos, jogos de futebol sem fim, com os jogadores que eu escolhia, com vitórias que eram sempre certas, porque só cabiam no espaço que eu permitia.
Estradas imensas, onde caminhos coloridos se espraiavam até onde a vista alcançava.
Amigos reais, tão reais que só eu os via.
E, na hora do lanche, aquela voz doce de todos os dias que acalmava intempéries, que sabia ser a certa, aquela que só as certezas indubitáveis é capaz de produzir.
Mas isso estava tão longe agora. Tão longe que só uma visão extra-longa podia alcançar. Com dificuldade.
(...)

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