segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Olá (II)

(...)
- Mas não há expectativas. Sim, porque tu não as conheces.
- Isso não. Por aquilo que percebi do que me explicaste não há. Nem sonhos, nem objectivos, nem esperanças. Aqui é sempre igual, nada muda, nada se modifica, é uma constância aqui, uma permanência.
- Um tédio.
- Isso também não sei o que quer dizer.
- Quer dizer que não se faz nada, que ficamos parados a olhar um infinito que não sabemos onde está. Um profundo enfado, um aborrecimento de morte.
- É curioso que utilizes essa palavra. Muitos dos que aqui chegam também a utilizam, embora nem sempre pelas mesmas razões. Por isso aprendi o que quer dizer, porque também não a conhecia, no fundo aqui também não se morre e enfado é tudo o que não vais encontrar.
- Com não? Dizias-me que tudo é permanente aqui, que não há surpresas nem expectativas, o que posso então esperar disto, o que fazer se não há nada para fazer?
- Enganas-te meu caro. Há muito para fazer. Só que não são coisas como aquelas a que estás habituado. Há outra, direi antes, outras realidades aqui. Diferentes, estranhas para quem não as conhece, mas não é assim com tudo o que nos é estranho e desconhecido, pelo menos ao princípio.
- Tens razão, o desconhecido sempre foi encarado com um misto de desafio e também muito receio. Por isso se criaram tantas histórias, lendas, mitos e tantos são o que neles acreditam sem dúvidas. Tantas ilusões.
- Ilusões? O que são ilusões?
- Meu caro, tu sabes muito pouco da vida.
- Vida amigo, vida é tudo o que tenho, sempre tive, mas diz-me, como se ganham ilusões?
- Ganham-se dizes tu, pois eu acho que mais facilmente as perdemos do que ganhamos, mas também é verdade que se não as ganharmos nunca as perderemos.
- Agora estás a ser enigmático. Explica-te.
- Tentarei. Ilusão é uma palavra prima da expectativa. São outra vez sonhos, desejos. Iludimo-nos com promessas que, a maior parte das vezes, são construções individuais, sem nenhuma sustentação objectiva e pensamos que poderemos obter aquilo que nos surge como metas que, a não as alcançarmos, nos tornarão a vida numa miséria. Sabes, no fundo são expectativas.
- Voltamos ao mesmo. Ilusões e expectativas são a mesma coisa?
- É verdade…
- E, pelo que percebi, saem sempre goradas.
(...)

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