domingo, 22 de maio de 2011

Histórias com Música (45)

Pegou nela pela mão, olhou-a nos olhos e encaminhou-a para o carro.
Olharam ambos o fio do horizonte onde um sol tranquilo se ia deitando.
Carregou no acelerador e arrancou. Primeiro o caminho fez-se suave, sem curvas e contracurvas, sem sombras, nem ruídos. Depois meteu a quinta velocidade e fechou o olhar.
A seu lado, ela fez o mesmo. Com os olhos semicerrados mal deixavam entrar os últimos raios de sol que os visitavam pela frente.
Acelerou, rapidamente atingiu a velocidade de cruzeiro. Quase que deixou de prestar atenção ao caminho. Os olhos fechavam-se momentaneamente, os dele e os dela. Do motor saía um rouco surdo, baixo e contínuo, mal se dava por ele.
O caminho continuava sempre em frente. As curvas que surgiam eram ultrapassadas quase sem darem por isso. Cortavam-nas sem se aperceberem.
Juravam nunca ter saído daquele carro, embora várias testemunhas tenham afirmado, convictamente, que os tinham visto sair, várias vezes. Que os tinham visto parar e caminhar. Que os tinham visto falar e até sorrir.
Mas nenhum deles se lembrava disso. Continuavam em velocidade de cruzeiro. Sempre em frente. Rumo ao sol que já se tinha posto. Em direcção a uma noite que não conhecia estrelas. Escura como breu. Como aquele alcatrão em que vogavam silenciosamente.
Quando o dia começou a despertar encontrou-os a velocidade ainda maior. Numa vertiginosa embalagem que já não admitia retorno.
Não conheciam o seu destino, nem isso lhes ocupava, minimamente, os pensamentos. Aliás estavam convictos que já não tinham pensamentos. Que avançavam apenas, sem nada esperar, sem nada importar.
Antes de chegarem à beira do abismo não repararam num sinal que avisava os mais incautos de um perigo iminente. Passaram-no a alta velocidade, roçando-lhe ao de leve.
Há quem jure que conseguiram sair do carro no último instante. Outros afirmam que não, que voaram em direcção ao precipício sem esboçarem o mínimo sinal de preocupação.
Na verdade nunca ninguém soube bem o que acontecera. O carro nunca foi encontrado. No caminho que fizeram nada ficou para testemunhar a sua passagem.
Apenas um leve vestígio ficou. Um sinal de trânsito quebrado jazia no chão a poucos metros do despenhadeiro. Apesar do mau estado em que se encontrava ainda era possível ler duas palavras, ESTRADA e FIM.

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