(...)Acho que já disse isto. Senão, digo-o agora. Noites cheias de luz. Claras.
Como aquelas que eu passava sentado no terraço. Era verões que nunca acabavam, com o rádio colado ao ouvido, sussurrando vozes e sons, músicas que me faziam as delícias.
Todas as noites uma dessas vozes me fazia companhia. Lembro-me bem, da meia-noite à uma. Música calma, sem interrupções. A melhor música do mundo. No sítio do costume.
Onde será que ela está? Porque não vem? Já era tempo.
Levanta-se um vento agora. Mais nuvens se aproximam.
Acho que vou beber um uísque.
Antigamente não gostava. Sabia-me a xarope para a tosse, daqueles que tomava em criança.
Um dia juntei-lhe um dedo de água lisa, como os escoceses gostam de fazer, descobri um novo gosto. Apreciei. Gostei. Sobretudo dos de malte. Sedosos, dourados, o verdadeiro néctar dos deuses. E uma bebedeira de uísque não dá ressaca.
Como aquela que experimentei. A grande, a única verdadeira. Aos 20 anos. Uma desvirginação completa. Forte e feia. Mas divertida. Uma alucinação intensa. Uma loucura de juventude irrequieta, a tentar provar não sei bem o quê. Horas e horas de bebidas várias, surtidas nocturnas pelo jardim público, vómitos e relva misturados. A perda dos sentidos e da memória daquelas horas e o acordar súbito e doloroso de quem afinal nada ganhou, mas que pensou ter-se superado, ter enfim ultrapassado mais uma fronteira, daquelas que não levam a lado algum. Um rito de passagem. Uma passagem que, no entanto, não deu para outra margem. Enfim, uma noite de copos com os amigos.
(...)
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