segunda-feira, 28 de junho de 2010

O menino que coleccionava horas


Às vezes sinto-me um menino, que olha para alto quando quer ver outro alguém que se parece mais velho e mais consciente, esquecendo que no meu corpo já se escondem muitos anos que prefiro não contar. Digo olá senhor, como está, nem reparando que o senhor com quem falo tem quase idade para ser meu filho, sem me aperceber que no seu fato e gravata mora apenas um miúdo que, talvez, me olhe com maior reverência, ou então com a complacência tão própria de uma juventude que desdenha os cabelos que se vão nevando.
Às vezes sinto-me um menino e mesmo sabendo que não posso correr como dantes, que os saltos saem agora mais baixos, que a vista não vai mais longe, que os músculos se andam a esquecer de como foi, continuo a estar convencido que a vida ainda agora começou e que os dias que vão surgindo não contam na corrida para o fim, mas se vão apenas acumulando uns ao lado dos outros, juntando ideias, brincadeiras, memórias de quem não crê que envelheceu, mas apenas que coleccionou horas.
É assim que me sinto, um menino que vai coleccionando horas, sem querer saber que a imagem que os espelhos lhe dão é a sua.
Não é! É apenas uma imagem e não a realidade, sim, porque esta anda vezes demais enganada.

1 comentário:

Apple disse...

Um menino que não usava relógio para coleccionar horas. Belo texto...